Sexta Sei: “Jesus Ñ Voltará”, vamos resolvendo os BOs com a poesia de Mateus Fazeno Rock

Segundo álbum do potente rapper cearense, o maior de sua geração, tem participações de Jup do Bairro e Brisa Flow, além dos cearenses Big Léo, Má Dam e Mumutante

por Fabiano Moreira
sextaseibaixocentro@gmail.com

Mateus Fazeno Rock por Jorge Silvestre e Naya Oliveira

Eu ando obcecado com o cearense Mateus Fazeno Rock, 28 anos, desde que, durante a pandemia, fui tremendamente impactado com a sua “Missa Negra”, especial de YouTube produzido em meio à precariedade que se eleva a arte da melhor qualidade, viva e pulsante. Nesta sexta (28), ele lança seu segundo álbum, “Jesus Ñ Voltará”, com participações de Jup do Bairro,  Brisa Flow e dos cearenses Mumutante, Big Leo e Má Dame. A partir dessa presença que partiu do título, ele constrói narrativas que falam de existências pretas, indígenas, existências e pobres em um álbum costurado pela sua própria vida. Falamos como a música transformou a sua trajetória, no sentido de despertar da consciência, mas como ainda continua sendo uma luta pagar as contas em dia, ainda na favela. Com vocês, a potência e a força de Mateus Fazeno Rock.

Moreira – “Jesus Ñ Voltará” já parte deste aviso de que nesse mundo, cabe a nós, humanos, resolvermos os BOs, né? De onde veio a inspiração para o álbum? Como você define o rock favela, como batiza o seu som?

Mateus Fazeno Rock – Então, eu acho que esse é um dos sentidos, sabe? É tanto sobre depositar toda a esperança de resolução dos nossos dilemas, questionamentos e problemas em alguém quanto sobre pensar que esse Jesus é uma presença que partiu. Acho que acaba que nem é uma figura central assim, apesar de estar no título. É sobre pensar mesmo sobre as nossas passagens por aqui um pouco sobre a valorização da nossa vida, assim em Terra, pensando sobre existências pretas, existências indígenas, existências de pessoas pobres assim e a valorização da nossa vida eu acho que tem um pouco sobre isso nesse álbum. Aí você me pergunta de onde vem a minha inspiração? A inspiração vem da minha vida mesmo. É um álbum totalmente costurado com memórias assim. Totalmente vinculado à minha história de vida e a história de vida de pessoas próximas a mim assim,né? Ou, pelo menos, a minha história enquanto estava próximo de pessoas ou, enfim, sobre esse encontro, né? De memórias e de vivências assim. Então, não é uma biografia, não está nesse lugar, é um álbum totalmente inspirado na minha vida assim, né? Tudo que é cantado é real, foi real, enfim, pretende ser real, algo assim. E por isso é rock de favela né? É um rock totalmente vinculado a esse processo de reconhecimento, de auto reconhecimento, de autoafirmação, de afirmação coletiva assim. Então, sim. 

Moreira – Na faixa com a Brisa Flow, há uma fala de grande impacto, “Brasil inferno, cemitério indígena, o que você vai esperar de um lugar construído em cima de povos, do genocídio de povos por ouro e prata”? Além dessa, quais são as principais denúncias da sua música? Porquê é uma nova música de protesto, né?

Mateus Fazeno Rock – Então, de alguma forma, eu nunca parei pra pensar sobre esses termos assim, por exemplo, música de protesto, música-denúncia, porque, de alguma forma, eu sinto que limita um pouco o que que a musicalidade pode ser e o que que as músicas podem ser. Obviamente, tem essas músicas que vm num lugar questionador, assim, de fato, mas eu acho que, na mesma medida, é a música que vem para falar sobre música, sobre fazer música, sobre então de um outro ângulo, de um outro ponto de vista, seria o lugar que talvez “Melô do Djavan” esteve no álbum anterior. Esse álbum todo é cravado por conversas e, nessa em específica, é uma conversa que eu estou trocando ali com a Brisa Flow, né? Sobre nossa correria, nesse Brasil construído dessa forma. Como é fazer música, como é ser MC, como é ser cantora, como é ser cantor nesse Brasil, como é sonhar nesse Brasil? É uma pergunta, é um um questionamento, ao mesmo tempo que é música, somente música.

Moreira – Você é cria da Sapiranga, bairro da periferia de Fortaleza, e começou a tocar violão em uma ONG Revarte (Resgate dos valores através da Arte), conta sobre esse começo e mais sobre a Fazeno Rock, rede de produção cultural que você comanda, como tem transformado o local? A música já transformou a sua vida, no sentido de grana mesmo?

Mateus Fazeno Rock – Faz dois anos que eu não moro mais na Sapiranga. Acaba que, da pandemia pra cá, eu vim migrando de bairro em bairro, de favela em favela, e atualmente, eu moro num outro bairro, e passei por uns três nesse caminho. As pessoas com quem eu trabalho, essa rede de artistas com quem eu trabalho, elas, na realidade, vêm de vários pontos da cidade, de vários bairros e favelas, não é uma um trabalho localizado. E, de alguma forma, acho que a gente se uniu também no intuito de se fortalecer. Por meio dessa música, sim, por meio desses shows que a gente produz, por meio de vários movimentos que a gente produz juntos, mas, muito no intuito de encontrar nesse elo algum fortalecimento paras nossas potências criativas e ativas, né? A música transformou a minha vida, sim, mas não no sentido de grana. A música transformou minha vida, sim, não no sentido de grana, mas no sentido de despertar minha consciência. A música me fortalece, a criação, não a indústria, o trabalho em si. Estar aqui em Fortaleza fazendo música não é nada fácil. Ainda pago minhas contas com dificuldade, ainda atraso conta, atraso aluguel, ainda não está nada certo. A gente tem tentado trabalhar muito bem, muito organizado, a gente tenta trabalhar com excelência e entregar o melhor naquilo que a gente se propõe a fazer, mas a gente ainda é precarizado,  ainda passa por vários bocadinhos para poder sustentar essa escolha, acreditando, sim, que a música, aos pouquinhos, vai transformando a nossa vida, mas não nesse sentido de grana a música ainda não mudou minha vida e não mudou ainda a vida das pessoas que estão caminhando comigo.

Moreira – Como se deram os encontros e as colaborações no álbum? Tanto de artistas da cena nacional, Jup do Bairro e Brisa Flow, e nomes da cena cearense, como o hip hop de Big Léo, Má Dam e Mumutante?

Mateus Fazeno Rock – Sobre os encontros do álbum, as pessoas que são daqui, da cidade, Big Léo, Má Dam e Mumutante, são pessoas que eu tenho, tive, vivências para além da música. São pessoas com quem eu convivo no meu cotidiano, nos espaços onde a gente frequenta, são pessoas com quem construí outras coisas juntos. Já com a Jup do Bairro e a Brisa Flow, a gente se conectou pela internet, a partir da caminhada do meu primeiro álbum “Rolê nas ruínas” (2020) foi fazendo, aos pouquinhos com o lançamento. Porque eu já acompanhava o trabalho de todas, enfim. É, já era fã, mas o que conectou a gente foi a internet. A música através da internet, né? É, e os feats vieram depois também. Depois a gente se conhecer um pouco, trocar ideia, saber um pouco da correria um do outro um da outro, um da outra, e, enfim, só a partir daí que que surgem os feats. Porque, enfim, eu já estava nesse processo de construção desse álbum também nesse período pós lançamento do “Rolê nas ruínas”.

Moreira – Vamos falar sobre a “Missa Negra”? Eu fui altamente impactado por esse trabalho, na pandemia. A gente estava preso em casa, e vem um cara de Fortaleza com tantos dedos para tantas feridas. Tem vários momentos que dá um nó na garganta. Da precariedade, ali se ergue um grande artista, vivo, inconformado, questionador, crítico. Eu amo a cara de pipa, que ideia impactante. Como foi a produção e o impacto no mundo desse trabalho? Eu revi essa semana e não envelheceu um minuto. Bom demais.

Mateus Fazeno RockEntão, o “Missa Negra” é uma espécie de show, espetáculo, que tem como intuito criar um momento coletivo ali, com outros artistas para possibilitar uma troca, um diálogo e a expansão de um diálogo que começa com as minhas músicas, no intuito de expandir um pouco as perspectivas assim do que já é conversado. Eu acho que eu trago pessoas que têm pontos em comum assim que é pensar sobre sobre territorialidade, sobre a sua vida, sua existência, questões de corpo, questões de gênero e raça, por meio da arte, de formas amplas assim. Eu estou falando aqui é porquê eu acho que palavras são didáticas assim paras as pessoas. De um modo geral, é pra pensar sobre existência assim, né? O “Missa Negra” celebra as existências marrons do mundo por meio da arte. A gente teve a possibilidade de produzir um material audiovisual e expandir um pouco com a perspectiva do que poderia ser o show através de uma experiência, né? Foi em um momento de pandemia, lockdown, com apoio da Lei Aldir Blanc. Produzir esse trabalho foi um desafio, apesar de tudo, não era muita grana, e era muita gente, e era um dia de set, sou grato à inteligência de geral assim para articular aquele momento comigo. Não sei que impacto ele pode ter no mundo assim, né, é uma dimensão que eu não não tenho, mas, pra mim, pras pessoas, eu acho que a gente ficou muito feliz de conseguir vivenciar aquele momento, fazer aquele momento virar uma experiência registrada e gravada aí pra sempre, né? Para enquanto durar a internet, vai existir a “Missa Negra”.

Abaixa que é tiro!💥🔫

Goiano radicado em São Paulo, o artista Antínoo conseguiu a toda a minha atenção com um lançamento duplo, com produção do craque maioral Adriano Cintra, a mente criativa da banda Cansei de Ser Sexy (CSS). Nesse rolê aqui, ele usa o auto-tune de forma inventiva para criar uma bossa-nova futurista. São dois covers bem criativos para “Infinito Particular”, de Marisa Monte, Carlinhos Brown e Arnaldo Antunes, que veio enfeitando a playlist da última Sexta Sei em versão “clubber e soturna”, e para “I Have a woman inside my soul”, (somos duas, rs), de Yoko Ono. Tudo pra anunciar o segundo álbum do gato (“só ando com cats 🐈 🎶”), que chega esse ano.

“Sempre que ouvia “Infinito Particular”, eu sentia um perigo na história que a letra conta. A música fala da profundidade de uma pessoa de forma carregada, exaltando qualidades e defeitos, colocando na parede quem apenas rodeia, mas nunca vai ao alvo. Quis fazer uma versão dessa canção trazendo a faixa para esse lugar sombrio, utilizando muitos synths e baterias eletrônicas e deixando o canto mais intenso”, conta o artista. O vídeo tem imagens feitas pelas coreógrafas e videoartistas Rosane Chamecki e Andrea Lerner, o duo Chameckilerner, que subvertem  o samba. Já a canção de Yoko foi escolhida por falar da feminilidade na sua essência pessoal. “Como homem gay, eu acredito que grandes qualidades da minha personalidade vêm do meu lado feminino. Cantar essa música traz uma questão de gênero sobre um homem reconhecendo e abraçando outro lado de sua vida”, reflete. Shantay, you stay.

Antínoo por Mariana Gabetta

Fiquei encantado também com o trabalho da cantora Niwa, que tem descendência indígena e japonesa. E é essa história de miscigenação que ela conta no belíssimo clipe de “Urutau” com anciãs da sua família, sua avó, Ayako, e sua tia, Áurea, afirmando uma identidade mestiça e falando sobre a força que há em pertencer. Sua mãe, japonesa, casou com paraense de origem tipicamente cabocla, com raízes indígenas, africanas e europeias. “Sendo uma pessoa mestiça, o processo de racialização é algo lento e ambíguo, e o racismo é extremamente velado. Foi algo que só me senti à vontade e com alguma propriedade para falar sobre depois de 2020, com 24 anos de idade”, conta. A faixa tem atmosfera eletrônica e ancestral e abre os caminhos para o seu álbum de estreia, que chega dia 5 de maio, “Araponga”, também batizado com nome de ave. O clipe, belíssimo, foi gravado no Copan, marco arquitetônico de São Paulo. Influenciada por Tetê Espíndola, Mercedes Sosa, Milton Nascimento, Björk e Djuena Tikuna (tá?), Niwa é formada em canto popular e pós graduada em Canção Popular pela Faculdade Santa Marcelina. Linda, indígena e japonesa!

Foto: Sofia Colucci
Fotos ramanitasoularts

Um acontecimento essas imagens de divulgação do álbum de estreia solo do profícuo ator, cantor e compositor Danilo Timm, que lança “NiLØ” no próximo dia 4 de maio. Quem acompanha aqui as novidades da quitanda sabe que ele é metade do duo Aquafaba, com bons serviços prestados à cena queer. Já falei dos dois álbuns deles aqui e aqui. Ele, que já foi preparador vocal de Fernanda Lima, Leandra Leal, Cláudia Abreu e Danielle Winits, trocou o Brasil por Berlim por um trisal e, hoje, dirige o coletivo Heart Chor. Agora, ele assina como Danilo Timm, com dois emes, para representar, visualmente, a dualidade de gênero. O álbum conta a sua história de transformação após a imigração, abraçando novas culturas, estruturas de relacionamento e formas de expressão. O título, “NiLØ”, é uma brincadeira com o próprio nome. O álbum mistura funk brasileiro, triângulo, bateria de samba, “yodelling” (canto dos Alpes alemães e austríacos), jazz, soul music e muito mais, em dez faixas produzidas por Emerson Villani (Thaíde, Karnak, Funk Como Le Gusta, Sérgio Britto, Renato Godá). Falei do belo clipe de “EnganoDesenganoaqui. Nos dias 14 e 15 de julho, ele se apresenta no Psicotrópicos Festival, em Berlim, com a minha Deize Tigrona, Bala Desejo, Liniker, NoPorn, Tássia Reis, Filipe Catto, Jonathan Ferr e mais.

A cantora, produtora musical e atriz carioca Amanda Magalhães acaba de lançar a contagiante “Doce Encanto”, homenagem a Oxum produzida em parceria com o baterista e percussionista Tuto Ferraz, maridão da nossa Fernanda Abreu e líder do projeto Grooveria.  Amanda é filha do renomado produtor e arranjador William Magalhães e neta de Oberdan Magalhães, ambos da Banda Black Rio. Esse é o primeiro single de seu segundo álbum, “Maré de Cheiro”, que chega em maio e sucede ao maravilhoso “Fragma” (2020), que teve participações de Seu Jorge e Liniker. Oxum é a divindade que domina as artes do amor e valoriza aquilo que é belo e fluido, a mãe das águas que vive nos rios e cachoeiras. No clipe, a entidade é evocada pelo Abebé, espelho usado por Oxum para se admirar, e o dourado/ouro, que representa sua riqueza. Oxum chega bem sensual, né? Gata.

Fotos: Renê de Paula
Lúdica Música! na foto de Arlete Heringer

A Fantástica Banda Invisível, com integrantes da Eminência Parda, faz show nesta sexta (28), às 19h, no Marechal Gastrobar Pub (número 810), com rock acústico e MPB 70.

Nesta sexta (28), às 20h, o Centro Cultural Dnar Rocha, será cenário do pré-lançamento da coleção de moda “É sobre liberdade”, da grife Mallonescria.

Vocalista da banda Skank, Samuel Rosa faz show acústico, sexta (28), às 20h, no Terrazzo.

O Movimento Samba das Mulheres na Praça completa um ano, no sábado (29), a partir das 17h, na Praça de Santa Luzia

Filipe Ret, TZ, Caio Luccas, Bielzin e Borges estão no line up da 3ª Edição JF Rap Festival, sábado, às 21h, no Expominas. 

O festival alemão Summer Breeze Open Air faz edição brasileira, sábado e domingo (29 e 30), no Memorial da América Latina, em São Paulo, com mais de 30 bandas e nomes como Blind Guardian, The Winery Dogs, Bury Tomorrow e Sepultura.

O Lúdica Música faz show, sábado, às 19h, no Beco, já finalizando esse rolê que fez a gente tão feliz aqui no Brasil. Eu fui ao Palco Central e foi lindo. O que vai ser mais bonito este ano do que a versão deles para Jura secreta, em homenagem à nossa Sueli Costa, que a compôs em parceria com Abel Silva? Pessoal coloca o sarrafo muito lá no alto, né, risos, citando uma frase do meu querido Gutti Mendes. O show de hoje é pra encerrar a Oficina Lúdica de Ritmos, que rolou, pela semana, no Centro Cultural Bernardo Mascarenhas. A abertura é com ex-oficineiros, como Peagah (filho do caboclinho da Lua Big Charles 🖤) e Tagadagadá.

O Festival Rise Together acontece neste sábado (29), às 20h, no Cultural, com shows de Obey!, em nova fase, como novo integrante, Gloria (SP),  Sensorium (Rio) e Disk (Jufas).

Domingo (30) tem festinha no Meiuca que eu gosto, das 14h às 20h, com  set do DJ Muller e lançamento da Casa Trezze Tattoo, com pintura ao vivo com Gloobmund.

O artista gráfico Dalton Carvalho abre está com a exposição “Fissuras”, na Galeria Ruth de Souza, no Teatro Paschoal Carlos Magno, com pinturas em acrílica sobre tela, papel e madeira, além de painéis impressos em offset feitos a partir de arquivos construídos e modelados em ambiente virtual. A visitação é gratuita, de terça a domingo, das 9h às 21h, até o dia 28 de maio.

Playlist com as novidades musicais da semana. Todas as playlists do 2012, 2021 e 2020 nos links. A playlist do streaming consolida lá pelas 2h de sexta.

Playlist de clipes com Arca, Aqno, Sofi Tukker, Rohma, Foyer Head, Röyakopp, Tiesto, Moby + Ricky Wilson,  Kali Uchis, Rico Nasty, Supercombo + Victor Kley, Kellvn, Edgar + Nelson D, Bebe Rehxa .+ Snoopy Dogg, Puterrier + Borges + Heavy Baile, Derxan + Big Bllakk, Ed Sheeran, Arlo Parks, Nathy Peluso, Brisa Flow + Ian Wapichana, Ney Matogrosso + Hecto

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