Sexta Sei: O shoegaze de Sophia Chablau e Uma Enorme Perda de Tempo

Banda paulistana apresenta em Jufas show do excelente disco de estreia, homônimo, produzido por Ana Frango Elétrico

por Fabiano Moreira
sextaseibaixocentro@gmail.com

Foto: Zoe Passos

A agenda de shows está voltando, depois de mais de dois anos de isolamento social, e a banda paulistana Sophia Chablau e Uma Enorme Perda de Tempo chega ao Café Muzik neste sábado (2) para apresentar seu bom álbum de estreia, autointitulado e lançado no ano passado, com produção de Ana Frango Elétrico (que abre hoje a playlist). Meu amigo Waguinho MPBDoll, da Dobra Música, é um grande entusiasta da banda (ops, tiete), e está me mandando ouvir, ó, faz tempo. “O show é uma festa! Já assisti a dois eletrizantes, os meninos sabem colocar todo mundo para dançar. Pode até parecer que estão perdidos, mas é tanta imersão que parecem estar em outro mundo, conectados entre si”, me contou, pelo WhatsApp.

“Fora do meu quarto”

O disco, que em muitos momentos, inclusive os que mais curti, lembra a psicodelia dos Mutantes, também acena para o shoegaze, estilo de indie rock inglês do final dos anos 80, de bandas como My Bloody Valentine e Loop, que tocavam olhando para os sapatos, daí o nome, shoegazers, com distorção, guitarras barulhentas e instrumentação harmônica que formam um caos sonoro. Além da rpodução de Ana Frango Elétrico, a banda teve o show de lançamento do disco dirigido pela cineasta Daniela Thomas. Chique, né.

Foto: Zoe Passos

Bati um papo, por e-mail, com Sophia Chablau, (voz/guitarra), Téo Serson (baixo), Theo Ceccato (bateria), todos com 22 anos, e Vicente Tassara (guitarra/teclados), 24, no qual falamos como a imundície e a delicadeza passam por um filtro mordaz, no disco, a inspiração para esse nome transante do grupo, shoegaze, Ana Frango Elétrico, a participação da guitarrista roqueiraça Lucinha Turnbull e de como a Sophia Chablau e Uma Enorme Perda de Tempo  é uma banda que sonha.

Foto: Helena Ramos

Moreira – O nome da banda veio de um conceito de Adorno para “tempo livre” como mercadoria a ser adquirida. Vocês se sentiam perdendo tempo quando começaram a fazer música?

Sophia Chablau e Uma Enorme Perda de Tempo – Olha, acho que por mais interessante que o Adorno seja, o nome da banda não é uma referência a ele ou a qualquer conceito dele. Principalmente porque discordamos em grande parte do que ele fala sobre a música e a canção. Somos, acima de tudo, fazedores e entusiastas da canção, diferente da chatice adorniana. Provavelmente, pra ele, fazer canção seria uma enorme perda de tempo, rs. Não acho que em nenhum momento achamos perda de tempo a música, num sentido pejorativo. Muito pelo contrário, somos absolutamente servos dela. Vivemos e pensamos nela grande parte do tempo. A grande sacada, na minha opinião, do nome da banda, é ironizar o fato das pessoas perderem seus tempos e vidas em coisas mesquinhas e a inversão de valores que vivemos no mundo. Perder tempo é estar com os amigos? É fazer canções? É sonhar um mundo melhor? O que é perder tempo e pior, como ganharíamos tempo? Estamos sempre perdendo tempo, porque o tempo não é contável, não é medido e não é de maneira alguma possível de acumular.

Foto de Gabriel Basile

Moreira – Tem influência do shoegaze, um caos sonoro, no som? Quais bandas vocês estavam ouvindo quando compuseram o disco?

Sophia Chablau e Uma Enorme Perda de Tempo –  O disco tem bastante influência de shoegaze! Estávamos não só ouvindo muito na época dos arranjos e da gravação como propriamente descobrindo o gênero (a maioria de nós pelo menos). O resultado disso foi a influência direta em algumas músicas que tem o barulho e o caos sonoro como recurso musical, mas também uma influência indireta no disco como um todo, que tem aquela intensidade do shoegaze reinterpretada de muitos jeitos diferentes. Algumas opções de produção do disco também tem a ver com essa influência, como os timbres quentes e distorcidos, por exemplo.

A capa do disco, com foto de Biel Basile e arte gráfica de Maria Cau Levy

Moreira Como vocês conheceram a Ana Frango Elétrico? Ela é muito massa, como parece? Sou muito fanzoca. Foi meu último show antes da pandemia.

Sophia Chablau e Uma Enorme Perda de Tempo – Conhecemos a Ana primeiro enquanto fãs do primeiro disco dela, “Mormaço Queima”, depois enquanto amigos e, por fim, enquanto companheiros de trabalho. E sim, ela é incrível! Desde o começo, nós queríamos ter ela como produtora, e ela também quis produzir a gente. Um dos pontos principais que buscávamos na produção da Ana é a capacidade de traduzir e transitar entre diversas linguagens que ela, enquanto musicista, compositora, produtora, poeta e artista visual tem de sobra. E isso foi muito importante, principalmente porque a gente não tinha nenhuma experiência de estúdio, então poder falar sobre sentimentos e cores e ver aquilo traduzido em sons (com a ajuda do engenheiro de som Gui Jesus) foi crucial para conseguir concretizar nossas intenções artísticas.

Foto de Gabriel Basile

Moreira – Que doideira o disco ter participação de Lucinha Turnbull! Como rolou esse encontro e como foi gravar com ela? Mito! Tem um perfume de Mutantes no disco, né? Eu sou muito fã da banda.

Sophia Chablau e Uma Enorme Perda de Tempo – Foi ideia da Ana! Nós precisávamos de um solo de guitarra para “Moças e Aeromoças” e concluímos que seria de longe a melhor ideia chamar a Lucinha, seja pelo peso histórico dela, claro, mas principalmente pelo jeito de tocar dela que nos fascina e maravilha. Gravar com ela também foi incrível! Lucinha é uma guitarrista genial que fez o melhor solo possível para a música, além de ter se transformado na nossa grande amiga do peito ao longo do processo.

“Delícia/Luxúria”

Moreira – Tem um clima meio anacrônico na banda, né, a impressão de que vieram de outro tempo, algo que fica bem explícito no clima e nos figurinos do clipe (amo) de “Delícia/Luxúria”. Há um desejo de voltar no tempo ou de reviver o passado?

Sophia Chablau e Uma Enorme Perda de Tempo – Não existe por parte de nós qualquer vontade de viver um passado. O passado tem coisas maravilhosas, óbvio, mas nossa banda é uma banda que sonha. Sonho não tem registro temporal cronológico. Sonhar é justamente a sobreposição de tempos na construção quase arquitetônica de uma realidade possível dentro de milhares de possibilidades possíveis. Nossos clipes têm essa pegada do sonho, nossa música também. Acho equivocado dizer que somos anacrônicos, ou que queremos reencarnar um passado, porque entre outras coisas, este passado foi absolutamente cruel com quem viveu ele. Ditadura militar, guerras, genocídios, invasões. Não sou fã dos anos 1960, 1970, sou fã de como no meio daquele caos, que em alguns momentos se assemelha ao que vivemos hoje, se conseguiu produzir tanta música linda. E quem resiste segue produzindo, seja na música alternativa, no rap (pra mim a maior demonstração disso), no funk, enfim. Isso não é saudosista.

Serviço

Sophia Chablau e Uma Enorme Perda de Tempo com abertura da banda juiz-forana Varanda, dia 2 (sábado), às 22h, no Café Muzik (Rua Espírito Santo 1081, Centro). Ingressos a R$ 22,50 aqui ou a R$ 20 na porta. Produção: A Gira.

Abaixa que é tiro!💥🔫

Foto de Ashlley Melo com styling de Nestor Mádenes e Thanara Schonardie e arte gráfica de Dani Hasse

Eu já tinha falando aqui da arte-educadora pernambucana Lulu Araújo no lançamento do divertido clipe clubber “Lululoops”, anunciando o disco de mesmo nome, “Lululoops”, que chegou essa semana ao streaming. Tá uma belezura só. Tem “Tubarão”, “bicho mordedor” que mergulha nas águas profundas das sonoridades pernambucanas, como ciranda, coco e brega, uma releitura de “How beautiful could a being be”, composição de Moreno Veloso que ganhou a doce tradução “quão bonito, pode um ser ser?, um arranjo 8bit em em “Forró Antero”, emulando a sonoridade das trilhas dos videogames, e a divertida “Trava-língua”, com a brincadeira que a garotada adora e feat com  Chinaina.

Este é o segundo álbum da carreira de Lulu Araújo, que já tocou com Naná Vasconcelos e é conhecida do público como a Fada Magrinha. Dessa vez, ela teve a direção musical nas experimentações eletrônicas de Missionário José, do grupo Mombojó. O disco tem ciranda, música eletrônica, cultura popular, congo, rap e repente. Segundo o Missionário José, o gênero do disco é  “Björk Família Pancadão”. O disco tem participações especiais de Kassin e Chinaina, entre outros.

Jade Faria fotos de Bruna Mayer na capa de “Solar”, seu primeiro EP

Além de plantar a semente de Sophia Chablau e uma enorme perda de tempo no meu coração, meu amigo Waguinho MPBDoll convidou a ouvir a voz belíssima de Jade Faria, 21 anos, paulistana radicada em São José dos Campos. Já passaram aqui pelas playlists sextantes duas faixas de seu EP de estreia, “Solar”: as canções “Sacada” e “Solar”, que ganhou clipe. O EP traz cinco composições solo ou em parceria com uso de “objetos achados”, instrumentos não convencionais que atravessam todo o projeto, como caixas de fósforos, baldes, canecas e sacolas plásticas. Jade estuda artes cénicas na USP e já atuou como atriz, diretora e pesquisadora. A única música em parceria, “Flor de Juá”, é um xote e lembra as canções da CIA Barca dos Corações Partidos, que o parceiro Beto Lemos integra.

 

O É Tudo Verdade –Festival Internacional de Documentários acontece, de forma híbrida, até 10 de abril, nas plataformas É Tudo Verdade Play, Itaú Cultural Play e Sesc Digital. Todas as sessões são gratuitas. A seleção reúne 77 produções, entre longas, médias e curtas, inéditas no país, retrospectivas e clássicos. São filmes de 34 países.

“A História do Olhar”

Na abertura, estão ensaios documentais inéditos no país do cineasta britânico Mark Cousins. “A História do Olhar” e “A História do Cinema: A Nova Geração”, ambos de 2021, ambos abordando o intervalo de individualização forçada pela pandemia. Abordagens documentais da pandemia refletem, tanto em títulos brasileiros quanto internacionais, a agilidade produtiva possibilitada pela revolução digital do final do século 20. O calor da hora se faz sentir com obras originais sobre a crise da democracia, a resistência à repressão autocrática, a emergência climática global e as lutas em vários fronts por mais diversidade.

 O encerramento será com “O Território”, de Alex Pritz, no qual o americano colabora com jovens videastas da tribo amazônica uru-eu-wau-waus e com o fotógrafo brasileiro Gabriel Uchida para radiografar o agressivo desmonte dos instrumentos de proteção aos índios e ao meio ambiente na era Bolsonaro.

Eu me divirto bem com os tweets da mineira radicada em São Paulo Isabela Coelho, 30 anos, do perfil “Senhora surda que ouve”, no Twitter. Ela nasceu com perda auditiva severa, é formada em Sistemas de Informação e viralizou ao compartilhar as experiências de aprender a escutar ouvindo música, após fazer um implante coclear pelo SUS. Aqui, ela mostra o incômodo de se ouvir pela primeira vez. Surda oralizada, ela ganhou a web por ser uma crítica e exigente, bem humorada e de texto leve e cheio de estilo.

Como ainda não entende as letras das músicas – ela está aprendendo a ouvir, lembre-se- sua crítica vai diretamente à qualidade musical. Contrariando o senso comum, ela não gostou muito de música clássica e Pink Floyd. Mas se amarrou em David Bowie, Michael Jackson e até em Katinguelê, apesar de ainda não ter gostado muito de música brasileira. Na primeira playlist que fez, tem Gorillaz, The Weeknd, Bruno Mars, Pharrel Williams Daft Punk, Dimitri from Paris e Modjo. Chique.

O Festival da Mata anunciou a próxima edição para o dia 25 de junho, mantendo BaianaSystem e Armandinho no line up, como seria em 2020, antes de a pandemia acabar com os nossos planos. Pra deitar no nosso sorriso, chamaram Marina Sena. Os ingressos que a gente comprou em 2020 seguem valendo, inshalá, e os novos ingressos estão à venda aqui. Justica é cega 🎵.

*O World Creativity Day está com inscrições abertas pelo site ou pelo e-mail connectingtreinamentos@gmail.com e acontece nos dias 20 e 22 de abril.

​​Playlist com as novidades musicais da semana. Nesse post, tem todas as playlists do ano. Ainda tem as playlists de 2021 e 2020.

Playlist de clipes com Jorge Drexler, Scalene + Edgar, Willow, Todrick Hall, Baby Alice, Chance the Rapper, Couer de Pirate, Kavinsky +  Kareen Lomax, Röysksopp + Andreas Nilson,  Ludmilla + Akon + Justin Love + Mousik, Mykki Bianco, Orville Peck, Alewya, Guitarricedelafuente, WC no Beat + Luccas Carlos + Hyperanhas e + L7NNON + Biel do Furduncinho, Beyoncé, Ibeyi + Jora Smith, Owerá + Lozk e Zimbra.

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