Volume é manifesto contra a velocidade e a superficialidade da indústria e a má remuneração dos artistas e fica no ar por apenas seis meses
por Fabiano Moreira
sextaseibaixocentro@gmail.com
Luiza Pereira, 32 anos, integrou a Inky, boa banda de rock paulistana que flerta com o electro e outras sonoridades em dois álbuns e uma gravação de single com o produtor Steve Lillywhite (Morrissey, Talking Heads, Rolling Stones). Por lá, ela tocava synth, e aprendeu a domar uma guitarra, na pandemia, primeiro, para driblar a loucura e, depois, para lançar o seu primeiro álbum solo, sob o pseudônimo Madre, o “Vazio Obsceno”, pela Seloki Records, focado na sonoridade do instrumento, uma pedrada só, cuja capa é uma bandeira negra flanando em nome da pirataria. O volume é um manifesto contra a velocidade e a superficialidade da indústria e a má remuneração dos artistas e fica no ar por apenas seis meses e, depois, estará disponível somente em versão física. “Quando você pega um disco na mão e você tateia, abre o encarte, sente o papel, coloca pra tocar, automaticamente, você entende que aquilo é uma coisa. Feito por pessoas. Acho que é importante resgatar a relação com a mídia física e a relação dos ouvintes com os artistas de forma mais humana”, reflete, em papo cabeça aqui para a Sexta Sei. “Me lançar solo fazendo algo que não sabia até então também foi um jeito de me colocar vulnerável e deixar as pessoas me verem começar, experimentar, errar, aprender… Sair da lógica do perfeccionismo e desse medo de errar, de se mostrar como é, que é um lugar comum para as mulheres”, dispara.
Moreira – Está muito lindo o seu álbum, “Vazio Obsceno”, como foi esse processo de passar do synth à guitarra e fazer um álbum todo em cima do instrumento? Você aprendeu a tocar guitarra no processo? O pau torou legal. Tá uma pedrada.
Madre – Antes de tudo, obrigada pelo elogio, por tirar um tempo pra ouvir o álbum e me dar esse espaço aqui 🙂Essas músicas são um retrato do meu primeiro contato com a guitarra, aprendendo a tocar, experimentando e compondo. Eu também não queria me repetir ou fazer o que já sabia com a Inky, por medo e comodismo. Me lançar solo fazendo algo que não sabia até então também foi um jeito de me colocar vulnerável e deixar as pessoas me verem começar, experimentar, errar, aprender… Sair da lógica do perfeccionismo e desse medo de errar, de se mostrar como é, que é um lugar comum para as mulheres.
Moreira – Muito interessante e político esse manifesto anti-digital do seu álbum, que fica nas plataformas apenas por seis meses e, depois, existirá apenas em forma física. É um recado direto para as empresas de streaming, pelas não-remuneração e precarização do trabalho dos artistas? A Sexta Sei surgiu pensando em processar os lançamentos que chegam neste dia, mas está ficando bem exaustivo peneirar em meio a uma enxurrada de lançamentos. E isso também levou aos lançamentos de meios-discos (divididos em duas partes e até em três). Acho que mudou a forma como consumimos música, levando a ser algo mais descartável e consumido de maneira mais fria e leviana. Sua ideia é resgatar o consumo de música e a relação de ouvinte/artista de forma mais humana? Desculpe a pergunta longa.
Madre – Esse manifesto veio justamente para questionar e criticar a má remuneração e a precarização do trabalho dos artistas e também esse consumo da música como algo descartável. Acho que a partir do momento que a música virou um play, um clique e deixou de ser algo material, ficou tão subjetivo que quem consome perdeu esse entendimento de que tem um trabalho atrás daquilo. Quando você pega um disco na mão e você tateia, abre o encarte, sente o papel, coloca pra tocar, automaticamente, você entende que aquilo é uma coisa. Feito por pessoas. Acho que é importante resgatar a relação com a mídia física e a relação dos ouvintes com os artistas de forma mais humana. Ouvintes e fãs não são números. Números não colocam comida na mesa, não vão em shows. Sem essa comunidade, a carreira musical é absolutamente insustentável. Claramente, chegamos a um ponto de crise com o digital e o streaming e quis abrir essa discussão.
Moreira – O manifesto também está na capa meio anti-capa, tradução visual dos elementos presentes nas músicas, uma capa silenciosa, efêmera e com poucos elementos. Ela emula uma bandeira pirata?
Madre – Sim! Eu queria uma capa preta pra subir uma bandeira pirata nas plataformas digitais, mas daí a Ana e o João, que estão fazendo todas as artes e a parte visual do disco, me sugeriram fazer uma capa que ficasse preta de longe e, no quadradinho ali do streaming, mas que tivesse uma simbologia e meu monograma. Eu amei e acabamos chegando nessa capa.
Moreira – Você também quis levar todo esse processo desconstrutivo para a gravação em estúdio, imersivo, com liberdade de horário para gravar. Como foi a experiência?
Madre – Essa primeira parte da gravação (guitarras, baixo e bateria) a gente gravou no estúdio do Lucas Theodoro, que é em um sítio. Ficamos quatro dias lá, só gravando e curtindo. Foi muito divertido, me lembrou do por que eu amo fazer música.
Moreira – O álbum é filho da pandemia, intimista, e traz temas como a desesperança e o ressentimento, além de desejos e devaneios. “Hora melancólica, hora agressiva e cheia de ruído”, diz a aspa no release. Quais foram os sentimentos e as motivações?
Madre – A minha maior motivação era não deprimir (risos), ter uma válvula de escape e uma forma de processar o que estava acontecendo naquele período. Foi o que me salvou – e ainda ganhei um disco. O “apaixonamento” que tive com a guitarra foi perfeito também para servir como fio condutor. Fazia um riff, via o que aquilo dizia pra mim e escrevia a música em cima. “Caos”, por exemplo, pra mim o riff era uma marcha fúnebre e resolvi escrever uma música sobre morte e a angústia existencial que vem diante desse tema. “Transe” foi uma música que eu fiz cantarolando e descrevendo a cena que eu tava vendo ali: uma tempestade formando, o vento esparramando as cinzas do incenso que tinha acendido… Olhar pra fora e pensar que a vida ainda acontecia e o sentimento de privação, de frustração, a sede de viver que eu tava. O disco passeia por tudo que eu estava observando dentro e fora: morte, reencarnação, desejo, angústia, desesperança, apatia, frustração, existencialismo… Foi colocar uma lupa de aumento nessas coisas que a gente sente o tempo todo e que fazem parte da vida.
Abaixa que é tiro!💥🔫
Cinco anos depois do último disco de inéditas, a banda goiana Boogarins traz ao mundo seu quinto álbum, “Bacuri”, reafirmando-se como um dos grupos mais potentes e criativos da atualidade. Concebido entre 2021 e 2024, o trabalho marca um retorno às raízes criativas por ser o primeiro gravado inteiramente em casa desde o primogênito “As Plantas que Curam” (2013), cujo show comemorativo de dez anos acabou de passar por Jufas, na Versus. Com texturas, camadas e ideias mais nítidas, o volume traz uma versão lapidada da linguagem de “novo rock brasileiro”. Ao escolherem gravar o disco “em casa e com calma”, canções e ideias individuais foram lapidadas de forma coletiva.
Os exercícios de experimentação se afastaram dos improvisos lisérgicos para dar lugar a uma estruturação de arranjos focada na energia dos quatro tocando juntos. O título faz referência à palavra de origem tupi que dá nome a um fruto da região amazônica e do cerrado e também é usada como sinônimo de “criança”. “É engraçado que sempre nos chamaram de ‘meninos’ e agora os ‘meninos’ são outros, os nossos filhos”, sintetiza Benke. A banda foi formada em 2013 por Benke Ferraz (guitarra e voz), Dinho Almeida (guitarra e voz), Raphael Vaz (baixo, moog e voz) e Ynaiã Benthroldo (bateria e voz).
Tenho acompanhado o trabalho do Nathan Itaborahy com interesse há três anos, desde que assisti ao divertido clipe de “Macaco Véio” no YouTube da Procult, ainda na pandemia. Ele acaba de lançar o seu segundo álbum, “O som da coisa”, um trabalho sensível que registra sua pesquisa com a sonoridade de objetos cotidianos, as “coisas” do título, como panela, pires, corrimão e banquinhos, a mudança para São Paulo durante a pandemia e a relação com a culinária. A mudança aparece na criação do arquétipo do “Matatu”, “meio um personagem, um matuto andando na cidade grande”, me conta, em papo pelo WhatsApp, sobre a versão mineira e masculina da Macabéa de Clarice Lispector. “Mudei pra cá pra ver se eu mudo alguma coisa em mim”, conta o artista, na letra, que ainda reflete sobre questões sociais. “É tanta gente com a pança vazia, e como é que pensa assim?”.
Sensibilidade e poesia também transbordam da cascata de “barulhinhos bons” em “Vivo de som”, que dá título ao trabalho. “Eu vivo de som, eu vivo disso, talvez por isso estou tão vivo”, declara, na letra. Em “O som da coisa”, ele fala do fascínio pelos sons cotidianos: “Tá na escova de dente, tá na porta, no pente, tá na ponta de ideia”. A faixa foi feita na cozinha, com panelas, potes, pia, fogão, panela de pressão e microondas. O volume chega quatro anos após sua estreia solo com “Sentado no Céu” e foi produzido entre 2021 e 2023 pelo próprio Nathan e por Douglas Poerner, também co-produtor do primeiro trabalho. “Sempre curti tirar som de coisas: panela, pires, corrimão, banquinhos. Mas parece que, durante a pandemia, o isolamento trouxe uma certa intimidade com alguns sons de objetos da casa, assim como a necessidade de criar com aquilo que se tinha por perto”, diz Nathan. Cada faixa foi feita em um ambiente do apartamento, explorando os recursos sonoros do lugar e sua ambiência específica, filosofia que também afeta o último álbum de sua companheira, Clara Castro, “Peranbule”, que participa nos coros de “Matatu” e “O som da coisa”. O querido Lucas Gonçalves (Maglore) gravou as guitarras de “Carta pra Roux”. A masterização é do craque DropAllien. A concepção da capa é de Fernando Fernandes, com fotografia de Rodrigo Ferreira e colagem de Júlia Fregadolli. A capa faz referência às geleias, molhos, farofas e granolas que ele vende, a marca “Pote Poético”.
A 14ª edição consecutiva do Festival Novas Frequências reúne 22 atrações e contempla shows, performances, DJ sets, conversas e uma instalação sonora, de 7 a 15 de dezembro, em cinco bairros do Rio de Janeiro. A programação – metade dela gratuita – se espalha por Casa França-Brasil, Centro de Referência da Música Carioca Artur da Távola, Solar dos Abacaxis, Quadra do Fala Meu Louro, Praça Agripino Grieco (Leão Etíope do Méier), Galeria Refresco e Galpão Dama. São estilos sonoros e trajetórias variados, reunindo, dentre outros, música improvisada, poesia falada, noise, funk carioca, arte sonora, electro-punk, techno, música contemporânea, ambient e samba experimental. Destacam-se as apresentações da banda Teto Preto, que lança no festival o álbum “Fala”; a guitarra noise-climática da peruana Ale Hop; “Enxame”, instalação do francês Félix Blume que recria os sons de uma colmeia de abelhas por meio de 250 alto-falantes; o encontro afro-indígena, inspirado nos escritos de Lélia Gonzalez, entre Ajítẹnà Marco Scarassatti, Maya Quilolo & Ibã Huni Kuin; e a ficção sônica com fitas cassete “Tudo pra mim é viagem de volta”, da artista Podeserdesligado. Quem também estreia no Rio, dentre outros, é Caxtrinho, com seu samba torto experimental; Chelpa Ferro & Fausto Fawcett, em uma performance de poesia falada e barulho maquínico batizada “Pesadelo Ambicioso”; e o avant-pop-funk de Lyzza, brasileira radicada na Holanda. A curadoria e a direção são do craque Chico Dub.
A talentosa dupla de artistas plásticos Mariana de Andrade e Rodrigo Dias está em cartaz com duas exposições. A primeira é “Manto Sagrado – Manto de Axé”, até o dia 6 de dezembro, no Centro Cultural Bernardo Mascarenhas (CCBM), destacando a relevância dos tecidos nas cerimônias de matriz africana por meio de uma imersão sensorial. No dia 5, eles abrem a segunda exposição, “Reza Forte”, que registra e celebra a cultura das benzedeiras, às 19h, na galeria Ruth de Souza do Teatro Paschoal Carlos Magno.
A segunda edição da GRAV rola sábado (30), no Maquinaria, com os DJs Everbeatz, HRKN, Femmenino e Starbaby, às 21h.
O artista André Lopes apresenta desenhos sobre tela na exposição “Raízes – sobre nós”, em cartaz no Espaço Manufato até o dia 29 de dezmebro.. O artista retorna ao cenário artístico após um hiato de mais de sete anos, explorando a essência das conexões humanas e os laços invisíveis que unem passado, presente e futuro. O artista tem como referência “A Leiteira”, de Vermeer.
Não conseguindo abrir aqui uma filial dos Sorvetes Cairu, o mineiro foi lá e criou a primeira cachaça de jambu do estado do pão de queijo, a Jambu de Fora, produzida pelo querido Luiz Carlos Torres Kaizin. A bebida combina a pureza da tradição mineira com a exótica flor de jambu que, como ensina Dona Onete, “treme”. “A boca fica muito louca, com o tremor do jambu”.
A Mostra da Diversidade Cultural: Imagens da Cultura Popular acontece até o dia 6, com 50 projetos participantes, com apresentações no Centro Cultural Bernardo Mascarenhas (CCBM) e no Beco da Cultura, como dá pra visualizar nas artes acima, com destaque para Grupo Folia de Reis Amigos de Santos Reis (29), a roda de samba “Buteco da Crispin”, com Alessandra Crispin e apresentação de danças urbanas “Improvisarte”, com o craque Raul Magalhães (30) e apresentação de Hip Hop do Espaço Hip Hop (2). O Espaço Hip Hop da gente, aliás, está completando três anos de serviços prestados à cultura neste domingo, a partir das 14h, sob o Viaduto Hélio Fadel, com batalha all style 1 x 1.
O Novo Samba Novo, com roda de Camila Brasil e JJ e discotecagem de Pedro Paiva, rola domingo (1), das 13h às 18h, no Museu Ferroviário.
A banda britânica de rock Bring Me The Horizon faz show no sábado (30), às 13h, no Allianz Park, em São Paulo.
Sexta (29) rola a final da In Da House DJ Contest, no Muzik, com Aristides, IroNN Music e KMRA disputando o grande título. O som será com Artis. No sábado (30), rola o primeiro Festival de Metal do Muzik, com Black Widow, Kymera, Mörtein, Enkosto e Erro404. A caa abre sempre às 22h.
Depois de show no Cultural, o ícone do reggae mundial Steel Pulse chega ao Circo Voador nesta sexta (29), com abertura dos baianos do AfroDef e a Cadeira de Som. No sábado (30), a bruxona mor Rita Bennedito hipnotiza e se rejuvenesce na frente da plateia com o show “Tecnomacumba”. Em ambos os dias, os portões abrem às 20h. No domingo (1), Dia Mundial de Luta Contra a AIDS, é mais cedo, às 17, com entrada franca, mediante doação de 1kg de alimento, no evento Rio sem preconceito, com Samba que elas querem convidando MC Carol, Caio Prado e Roberta Sá e BallRoom com Wallandra e Baby Ball. A tarde é organizada pela Coordenadoria Executiva de Diversidade Sexual.
A cantora Áurea Martins volta ao Teatro Rival Petrobras, no Rio, na sexta (29), às 19h30, com seu show “Senhora das Folhas”, homenageando o poder feminino curador. No sábado (30), às 19h30, tem o espetáculo “Velha Guarda Musical da Mangueira homenageia ilustres mangueirenses”. O cantor e compositor Leo Russo comemora seus 15 anos de carreira, na terça (3), às 19h39, com o show de lançamento do álbum “A gente merece”, que passou aqui pela playlist do dia 22. O ator e diretor Amir Haddad e o Grupo Tá Na Rua encenam o espetáculo “Zaratustra: uma transvaloração dos valores”, em apresentação única na quarta (4), às 19h30.
O jornalista Camilo Rocha lança o livro “Bate-estaca” com as festas Wobble e 220 no D-Edge carioca.
Rubel faz show na Arena Carioca, neste sábado (30), na Arena Jockey, às 20h, no Rio, com participações de BK’ e Tim Bernardes.
Playlist com as novidades musicais da semana, que consolida às 2h da sexta. Todas as playlists de 2023, 2022, 2021 e 2020 nos links
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