Neo-nazis, influencers e muita soja para colher

por Nicolai Guanabara

O que se entende por nazismo? E por fascismo? Seria possível falar que hoje vivemos em mundo que “banaliza o nazismo”? Tais questionamentos se fazem imperativos ante a difusão de tais termos por meio da internet, sobretudo das redes sociais, o que trouxe a utilização indiscriminada de conceitos políticos.

A par de se fazer um estudo acadêmico acerca do tema, alguns conceitos devem ser pontuados.

Enquanto gênero, o fascismo deve ser encarado como uma teoria política que, assim como o comunismo, tem por fim suplantar o liberalismo vigente, por meio da união da classe trabalhadora, porém calcado em valores dissonantes daquele, como o nacionalismo e o antimaterialismo.

Vale dizer: ao contrário de uma concepção de um desenvolvimento histórico a partir da luta de classes, o fascismo tem como cerne a busca de hegemonia política, no plano global, de determinada nação, vista como superior no plano sociocultural. Tal hegemonia seria alcançada por meio de um acordo com a elite econômica e mediante conflitos entre estados nacionais, daí seu caráter, em regra, belicista. Vê-se, aí, a falsa dicotomia civilização x barbárie.

Ao revés do liberalismo e do comunismo, que estão centrados, respectivamente, no indivíduo e na classe, o fascismo tem ainda como essência o nacionalismo (e não o patriotismo), visto como uma coletividade unida por traços socioculturais, linguísticos etc..

E é em virtude da variabilidade, em razão da época e das peculiaridades de cada povo, do entendimento desse caráter nacionalista do movimento, que se diferem as várias espécies de fascismo.

É o caso do nacional-socialismo alemão, o nazismo, cujo nacionalismo confunde-se com a acepção de raça, em seu sentido biológico, levando, em última análise, à eugenia. O Nazismo percebe o outro, portanto, como “não humano”.

Diante de tais premissas, vê-se, pois, que os termos fascista e nazista são utilizados de forma obviamente irresponsável. É o caso daquele que chama fascista (ou nazista) àquele trabalhador que, em razão de experiências negativas pelas quais passou, defende uma visão mais truculenta da atuação policial no combate ao crime, por exemplo.

Dentro desta irresponsabilidade terminológica está inserida a “banalização do nazismo”. Mediante uma simples busca na internet é possível encontrar artigos e vídeos de indivíduos que, sem qualquer critério, fazem defesa de regimes fascistas e nazistas, inclusive defendendo a legitimidade de que se crie, na Brasil, um partido político com viés nazista.

São, em verdade, duas faces da mesma moeda: de um lado os que se agarram a argumentos claramente falaciosos com o fim de defender a legitimidade de um regime de exclusão racial; de outro, indivíduos que chamam nazistas qualquer um que defenda ideias que foram por eles taxadas como máximas de autoritarismo.

Discussões infindáveis sobre o tema, outro questionamento se impõe: visto que os termos e ideais fascistas, entendido como gênero, são utilizados de forma aleatória, e até irresponsável, no caso daqueles que acreditam, de fato, em uma superioridade racial (fato este que demanda a atuação do sistema de justiça penal), a quem interessa essa “polêmica”? Ao establishment, naturalmente.

Bem analisados os fatos, no fundo, trata-se a questão de um reducionismo de uma velha e superada dicotomia esquerda x direita, que tem como suporte o identitarismo. E isso é o que deseja o sistema neoliberal: que se passem desapercebidas as tenebrosas consequências da concentração de renda e o futuro que se avizinha, no qual uma horda de escravos sem consciência de sua situação, inebriados por discussões vazias acerca de preferências individuais, trabalham a favor da elite estabelecida.

Isso é elucidativo do porquê de estados subservientes como o Brasil não tomarem frente na situação e impor controle e sanções àqueles que se prestam ao serviço de enaltecer políticas e medidas claramente eugenistas. Esclarece também a existência de cada vez mais campanhas de desinformação promovidas pela grande mídia, a serviço do Establishment, que busca cada vez mais promover a máxima “dividir para governar”. Tais discussões vazias nada mais são do que cortinas de fumaça, que visam a mudar o foco do que realmente interessa no plano econômico e social.

O fascista, para muitos, é aquele dono de mercearia na periferia que, cansado de ser assaltado por indivíduos de arma em punho em uma motocicleta com escapamento estourado, e de não ver resultado prático dos impostos que paga, busca uma alternativa que tem viés repressivo seletivo aos olhos de uma dita parcela progressista da sociedade.

De igual forma, aquele pequeno empresário, que tem na folha de pagamento duas balconistas, que nega ou minimiza a escravidão ou o holocausto, e que entende de forma estúpida fazer parte de uma elite racial e econômica, têm seu discurso vazio replicado por uma ordem de lacradores. Prato cheio para a mídia corporativa, que busca perpetuar e requentar tais notícias, “incentivada” ainda pela inércia do estado em sancionar o cidadão na esfera penal.

No plano prático, a discussão sobre a fala inconsequente e irrelevante de um “influenciador digital” ganha mais repercussão do que o preço do óleo de soja no país que mais produz o grão, que em outra época e lugar seria motivo para um levante popular.

Existe, contudo, uma luz no fim do túnel. Veja-se, nesse sentido, a destruição do Batalhão Azov, na Ucrânia, pelas forças russas, fato que deveria servir de exemplo de como lidar com extremistas neo-nazis e restaurar a sanidade de uma sociedade cansada de servir a quem nada produz, a troco de migalhas.

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