Sexta Sei: No Pixinverso, pelas mãos do clarinetista e saxofonista Caetano Brasil

Jovem músico de Jufas, indicado ao Latin Grammy em 2010, com “Cartografias”, retorna ao disco revendo a obra imortal de Pixinguinha

por Fabiano Moreira
sextaseibaixocentro@gmail.com

Caetano Brasil em fotos de Igor Tibiriçá

O jovem clarinetista e saxofonista juiz-forano Caetano Brasil, 27 anos, foi indicado ao Grammy Latino, em 2020, como melhor álbum de música instrumental pelo autoral “Cartografias”. Este ano, ele volta ao disco relendo a obra de Pixinguinha (1897 – 1973) com o excelente “Pixinverso – Infinito Pixinguinha”, acompanhado de uma banda sofisticada formada pelos músicos locais Guilherme Veroneze (piano), Gladston Vieira (bateria) e Adalberto Silva (baixo). O nome do álbum, que poderia até ser inspirado no filme do Aranha, mostra o esforço em contar a história do maestro, flautista, saxofonista, compositor e arranjador de uma forma contemporânea, na qual a spoken word dos slams e os filmes de animação são aliadas do músico.

“Pixinverso – Infinito Pixinguinha”, com capa de Renan Torres 

O disco é focado em estreitar os laços entre o choro, o jazz contemporâneo e a world music, relendo composições que fazem parte da vida de milhões de pessoas e revelam “um Brasil preto, popular e ancestral”, nas palavras do artista, com quem bati um papo, por e-mail. Falamos como esse trabalho busca a (re)conexão com o Brasil de verdade, e como Pixinguinha está lá, o tempo todo, em meio a interseções que amplificam a sua mensagem. Também falamos como o intelecto não é ingresso para a apreciação da música instrumental, que fala, mesmo, ao coração e aos quadris. “Ideias tão soltas no ar igual wi-fi, em algum momento alguma antena a sintoniza”, profetiza.

Moreira – Qual a importância de se rever a obra de Pixinguinha? Quais são as grandes lições pra gente hoje?

Caetano Brasil – Para mim, Pixinguinha, para muito além do homem e do gênio, é um símbolo. Pixinguinha é embaixador do “Brasil de verdade”. Um Brasil muito mais profundo, que não é feito de patos e camisas da CBF. Um Brasil preto, popular e ancestral, do qual a gente anda bem esquecido. Então, eu acredito que o que move a gravação deste álbum é a busca desta (re)conexão, ser instrumento disso. Pixinguinha soube, como poucos, sintetizar esse Brasil em sua música tão generosa e infinita em possibilidades. É incrível ver como ela sobrevive tão fresca e madura à ação do tempo e à transformação do espaço. Pixinguinha nos ensina a cada nota quem de fato nós – povo desta terra eternamente deitada, eternamente deitada em berço esplêndido – somos.

“Naquele tempo”, com poesia falada de Laura Conceição e animação do Estúdio TEI

Moreira – “Naquele Tempo” e “Carinhoso” foram atualizadas com os instrumentos fazendo as vezes de sirenes, urna eletrônica (tá chegando) e toques de celular. A primeira ainda tem spoken word de Laura Conceição e lyric-vídeo de animação do Estúdio TEI, é bacana essa sinergia com outras formas de linguagem, moderniza esse conteúdo. Como você trouxe esse repertório para os dias atuais?

Caetano Brasil – O diálogo entre as linguagens tem se mostrado a grande tendência da arte contemporânea. E eu acredito muito que é por meio dessas interseções que a mensagem se amplifica, ganha força. Na era em que tudo é visual, na urgência do código falado, nada mais justo e natural que me aliar a gente que pode somar sua potência à minha. E Pixinguinha está lá, o tempo todo! A gente torce, revira, subverte, vira de ponta cabeça, mas a sua ânima segue sendo a bússola.

“Carinhoso” ao vivo na JF Rock City TV

Moreira – Quais os principais desafios de se fazer música instrumental?

Caetano Brasil – Acho que o principal desafio é mostrar pras pessoas que o intelecto não é ingresso para a apreciação. Muitas vezes, quem toca música instrumental se esquece de tocar pras pessoas: toca só para músicos – muito preocupado com quem será capaz de compreender que manobras ousadas esse sujeito propõe – ou (pior ainda!) toca para si. Música instrumental ficou elitizada, não está na grande mídia e é tratada como souvenir por quem tem l’argent, capicce? Mas música instrumental é música pra falar ao coração e aos quadris – não necessariamente nesta ordem. Acessá-la demanda oportunidade e, em seguida, peito aberto, a disposição de mergulhar no subjetivo, no que não pode ser traduzido em palavras. As pessoas andam distantes disso, mas não é culpa delas, sistema as afasta (se bem que o sistema é operado por pessoas… anyway). Eu sigo acreditando que é possível.

Os singles que aqueceram pro disco, com capas maravilhosas de Renan Torres

Moreira – O que muda pro artista ser nomeado ao Grammy Latino 2020? Isso abre muitas portas? Parabéns 😉 Esse disco “Cartografias” é muito bonito, de uma época quando ainda podia fazer lançamento, o show no palco do Central foi muito especial… Me marcou também.

Caetano Brasil – Fico feliz que este show tenha te marcado, tenho ótimas lembranças dele. Saudade de um show de lançamento (né, minha filha?). Quanto à indicação, é um marco, sem dúvida, muito importante na minha carreira. Não fiz o disco para ser indicado ao Grammy, mas receber este grau de notoriedade reafirma meu espaço, os lugares que ocupo e todes que vêm comigo. Representa muito ser um músico preto, LGBTQIA+, fazendo música autoral, independente, instrumental, fora do eixo Rio-São Paulo, ter esta rubrica no meu currículo. Parece música da Xuxa, mas a gente precisa acreditar no que a gente tem a dizer. Como disse a Laura Conceição no texto que elaborou para a abertura do “Naquele Tempo”: “A música é o caminho!”.

Moreira – E as rodas de choro das quartas-feiras no Container Bar, têm perspetiva de voltar? Eu fui uma única vez, pouco antes da pandemia, e senti um clima especial, até mesmo de formação de novos músicos, sem cobrança de entrada. Esse dia eu fui feliz, viu. Você também produziu o disco “Chora, Princesa! – Um Painel do Choro Contemporâneo de Juiz de Fora!” (2019), com 23 músicos e 9 compositores de diferentes gerações da cena do choro em Juiz de Fora. Há um compromisso com o fomento a essa cena aqui? Quais são os próximos projetos?

Caetano Brasil – Ah, o Projeto Mão na Roda é uma das coisas que mais me orgulho de ter encabeçado. A vida mudou muito desde o início da pandemia. A rotina, os afazeres são outros. Por enquanto, não tenho perspectiva de retomada, mas o Mão na Roda é uma ideia. Ideias tão soltas no ar igual wi-fi, em algum momento alguma antena a sintoniza. O “Chora, Princesa!” veio daí, da vontade de registrar quem tá aqui fazendo choro no meu tempo. A minha presença, a minha decisão de permanecer morando aqui em Juiz de Fora, depois de ouvir – incontáveis vezes – “quando é que você vai pro Rio?”, é, por si, o próprio fomento. Quem está aqui importa tanto quanto quem está lá. Minha música é livre, eu mesmo vou e volto (de máscara, PFF2, de preferência), mas é gratificante colaborar com a transformação do lugar de onde venho.

Abaixa que é tiro!💥🔫

Com o tema “Nova Bahia”, o Festival Afrobapho traz nomes da nova música independente baiana que estão ascendendo em meio às dificuldades, de hoje (25) a domingo (27), totalmente online, no Instagram e YouTube. Os shows musicais acontecem no sábado (26), às 19h, no YouTube, com Cronista do Morro, Nininha Problemática, DICERQUEIRA, Yan Cloud, As Mambas, Vittor Adél, Evylin, WARI, Aglei, Neftara e Heder Novaes. Em pouco mais de seis anos de trajetória, o coletivo é conhecido por suas produções artísticas e culturais, que mobilizam o cenário nacional com perspectivas de diversidade e inclusão. O festival ainda terá rodas de diálogo, workshops de dança e performance e intervenções de artes integradas. A frente de produção, equipe de apoio e artistas convidados é totalmente formada por pessoas negras e LGBTQIA+.

Quem acompanha aqui as playlists da Sexta Sei já tinha ouvido aos três singles de “Sob o signo do amor”, primeiro disco de inéditas de Dulce Quental desde “Beleza Roubada” (2004). O novo álbum foi composto num autoexílio involuntário e mágico em Angra dos Reis, em 2020, numa casinha selvagem à beira mar. A produção é dos talentosos irmãos Jonas e Pedro Sá,  da nova geração.

“Sob o Signo do Amor” nasce de um contraponto. De um lado, temos esse estado de terror, a indignação pelo desgoverno Bolsonaro bombardeando as redes sociais com o seu terrorismo e os números de mortes na pandemia aumentando… De outro, a urgência em viver o amor e uma sexualidade aos 60 anos, rica de enamoramento e erotismo, o desejo de afirmar a própria experiência num mundo que está desabando, apesar de tudo vale a pena apostar nas nossas próprias ficções. A resistência se faz dessas pequenas histórias”, acredita a artista, que surgiu como diva no grupo Sempre Livre, nos anos 80, cantando sucessos como “Eu Sou Free”, “Esse Seu Jeito Sexy De Ser” eFui Eu”.

Fotos de Caroline Bittencourt

Faz pouco que eu conversei com o multiartista Edgar, que é atração do Lollapalooza Brasil hoje e acaba de lançar o bom EP “Ultravioleta”. A primeira faixa, “Bíblia, Boi e Bala”, já veio abrindo a playlist aqui na semana passada e fala dos três pilares da sociedade brasileira: as bancadas militar, evangélica e capitalista. “A hierarquia do pecado” abre o EP falando sobre o baile da Vogue que teve tema escravagista, mas com poucos negros no miolo da publicação. As duas faixas têm Kassin nos sintetizadores. Já a última inédita, “Fake News”, fala “que a gente tem que arrancar a cabeça do político corrupto e colocar em cima de um púlpito”, explica Edgar, que promete clipe com ele vestido de soldado brasileiro, enterrando o presidente.

EP “Ultravioleta”

O artista vai expor no MAM-Rio, na exposição “Nakoada”, ao lado de mais três artistas indígenas com curadoria de Denilson Baniwa e Beatriz Lemos, como parte das comemorações dos 100 anos da Semana de Arte Moderna.

Canais de TV, como Bis, Multishow e Globo, vão transmitir, neste final de semana, os shows do festival Lollapalooza Brasil, que acontece de hoje (25) e domingo (27). O evento marca a retomada da agenda de grandes festivais do país e rola no Autódromo de Interlagos.

Entre os destaques da programação, estão The Strokes, Doja Cat, Machine Gun Kelly, Jack Harlow, Marina, Caribou, Pabllo Vittar, Ashnikko, Matuê, Jetlag e Edgar (hoje, 25), Miley Cyrus, A$AP Rocky, Alessia Cara, Emicida, Silva, Jão, Terno Rei, DJ Marky, Clarice Falcão, Jup do Bairro, MC Tha e Lamparina (26), Foo Fighters, Martin Garrix, Alesso, The Libertines, Black Pumas, Kaytranada, Gloria Groove, Djonga, Rashid, Fresno, Marina Sena e Lagum (27). A programação completa está aqui.

Hermeto Paschoal no Bandamp. Foto_ Gabriel Quintao
O documentário _Transversais_, de Émerson Maranhão
O filme de ficção _Madalena_, de Madiano Marcheti

Essa dica quente é do Dudu Marote. “Hermeto Pascoal relançou 11 álbuns no Bandcamp. Ganhou os direitos de volta e tá tudo lá. Pra ouvir, pra se inspirar, quem sabe pra samplear algo. É tão phoda que o Bandcamp fez um artigo brabo sobre isso”, tuitou, sobre o artigo de Philip Freeman. Estão lá os discos “Planetário Da Gávea” (1981), “Hermeto Pascoal E Grupo” (1982), “Lagoa Da Canoa – Município De Arapiraca” (1984), Brasil Universo” (1986),Só Não Toca Quem Não Quer (1987) e Por Diferentes Caminhos (1988).

Dois filmes em cartaz na Netflix dão visibilidade à transgeneridade. O primeiro é o documentário cearense “Tranversais”, de Émerson Maranhão, que acompanha cinco pessoas trans de diferentes profissões, origens e classes sociais. O filme seria, originalmente, uma série, mas foi vetado seu financiamento, em agosto de 2019, pelo governo federal. 

Já o filme de ficção “Madalena”, de Madiano Marcheti,  faz uma denúncia contra os altos índices de violência contra a comunidade trans no Brasil e fez boa trajetória em festivais pelo mundo. A trama mostra como três pessoas estão envolvidas no misterioso desaparecimento de uma mulher trans em uma cidade do Mato Grosso do Sul

Ah, tem uma gata juiz-forana em “Queen Stars”, a disputa de drags cantoras da HBO Max. Estamos com você, Ravell, arrasa, queen. Os três primeiros episódios estão na Fuzzco News, e ela pisou demais.

Geral sentiu a partida de Nega Gane, essa artista tão potente.

​​Playlist com as novidades musicais da semana. Nesse post, tem todas as playlists do ano. Ainda tem as playlists de 2021 e 2020.

Playlist de clipes com Rosalía, Residente + Ibeyi, Tatá Dellon, Lucas Gonçalves, Edgar, Devault, Cheat Codes + Icone Pop, Clean Bandit, Muse, Grag Queen, Papatinho + MC Carol + Jojo Maronttinni + MC Dricka, Luisa Sonza + DJ Gabriel do Borel + MC Frog + Davi Kneip, Zeeba + Nanno, Scalene + Gabriel Zander, Midwxst, Lorde, Ben., Nas + A$AP Rocky + DJ Premier e Lil Jon + Jaysounds & Kronic.

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